Justiça do Trabalho anula justa causa e reintegra empregada vítima de violência doméstica
- Beatriz Magalhães Advocacia
- 13 de ago.
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Atualizado: 30 de out.

Em agosto deste ano, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) completou 19 anos. Inclusive, o mês de agosto, por meio da campanha "Agosto Lilás", passou a ser o mês de conscientização e combate à violência contra as mulheres.
Certo é que a violência doméstica impacta não somente a vida pessoal da mulher, mas também a vida profissional e todos os demais campos da sua rotina. Além dos problemas físicos e emocionais desenvolvidos e a insegurança sentida, a empregada, possivelmente, vai começar a faltar os dias de trabalho, já que possui receio de sair de casa. Ainda, pode acontecer da empregada precisar se afastar do trabalho para a recuperar sua saúde física/ emocional.
Nesse sentido, a Justiça do Trabalho é de suma importância para que, em eventual dispensa, de empregada vítima de violência doméstica, possa ser analisado se os procedimentos adotados foram respeitados e se houve legalidade, já que essas profissionais acabam se ausentando do trabalho por temor de novas agressões.
Caso concreto:
À título de exemplo, o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (Minas Gerais) confirmou a nulidade de uma demissão por justa causa aplicada à uma empregada que, em razão da violência doméstica sofrida, faltou diversas vezes ao trabalho.
Em janeiro de 2021, a empregada teve sua casa invadida pelo ex-companheiro e foi covardemente agredida pelo homem. Assim, nos dias seguintes, a empregada deixou de retornar ao trabalho já que estava com medo e receio do que mais poderia acontecer. A mulher procurou unidade policial e registrou boletim de ocorrência, solicitando medida protetiva contra o ex-companheiro.
No caso, a empregada informou sobre o ocorrido à empresa e a própria empresa determinou que ela aguardasse em casa até nova orientação. No entanto, dias depois, recebeu um telegrama pedindo que a funcionária justificasse suas ausências. Posteriormente, a empregada foi dispensada por justa causa, sob a alegação de faltas injustificadas (desídia).
Ocorre que, no caso, ficou registrado que a empresa sabia das circunstâncias vividas pela empregada e que deixou de atuar conforme determina a legislação em casos de violência doméstica.
Importante ressaltar que em casos de violência contra a mulher, é garantida a manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do trabalho, por até 6 (seis) meses.
Ou seja, como a empresa sabia da situação, deveria ter encaminhado a empregada para atendimento médico/psicológico, para a obtenção de atestado médico, e posterior afastamento (lembrando que a empresa fica responsável pelo pagamento dos salários por até 15 dias). Posterior esse período, a empregada deveria ter sido encaminhada para o INSS.
Art. 9º, §2º, II da Lei 11.340/06:
[...]
§2º O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica:
[...]
II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses.
Além de outras peculiaridades do caso, já que a funcionária era empregada pública, a decisão ponderou que a empresa não assegurou a efetivação da legislação de proteção à mulher já que cabe "ao poder público e à sociedade proteger as mulheres vítimas de violência doméstica e familiar."
Art. 3º, caput da Lei 11.340/06: Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.
[...]
§2º Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para o efetivo exercício dos direitos enunciados no caput.
Dessa forma, a decisão entendeu que a empresa não ponderou corretamente a aplicação da justa causa, já que sabia das circunstâncias do caso, e que deveria ter orientado a funcionária a procurar atendimento médico para eventual afastamento. Assim, não houve desídia ou abandono de emprego, já que é razoável que, ao sofrer violência doméstica, a mulher fique vulnerável e temerosa de sair de casa nos dias próximos à agressão.
Logo, a dispensa foi anulada e foi determinada a reintegração da empregada ao seu cargo antigo com o devido pagamento dos salários atrasados.
Processo nº 0010595-75.2021.5.03.0014
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Nessas situações, é importante esclarecer que, a competência para determinar essa medida (medida protetiva com manutenção do vínculo trabalhista) é do Juiz da Vara de Violência Doméstica ou Juízo Criminal, já que o afastamento não advém da relação de trabalho, mas sim da situação emergencial que visa garantir a integridade física, psicológica e patrimonial da mulher. No entanto, a empregada não fica impossibilitada de buscar a Justiça do Trabalho para que, em eventual dispensa que tenha relação com o caso de violência, possa discutir a aplicação da penalidade, sendo que cada caso é um caso.
Inclusive, é importante que, nessas situações, a empregada esteja amparada por uma medida protetiva de urgência/ decisão que reconheça a situação de risco e que informe, por escrito, à empresa, sobre a situação vivenciada, para que assim, caso sofra uma dispensa arbitrária, possa buscar a Justiça do Trabalho.
Beatriz Magalhães - OAB/RJ 258.608




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